Fábio Oliveira

“Esta é a vossa casa!”

 É difícil falar no pretérito de uma experiência que continua tão presente, tão viva. Uma experiência que passou a ser parte da minha vida, a ser a minha vida, que marcou decisiva e definitivamente o meu “eu” mais profundo.

Recordo-me perfeitamente da primeira vez que entrei na pacata vila de Vouzela, à procura do Instituto Missionário Marista, onde ia participar num encontro da MarCha. Quando finalmente encontramos o grande edifício que na época era ainda vermelho, estava entusiasmado e expectante em relação aos três dias que passaria ali. As boas vindas foram-nos dadas pelo Padre Champagnat, com as suas ternas palavras: “Esta é a vossa casa!”. Não imaginava eu até que ponto chegaria a ser concreta essa afirmação.

Fiquei apaixonado pela MarCha, pelos Irmãos que conheci, cresci no grupo, com o grupo, conheci esse homem com um nome que até então me era completamente estranho (Champagnat), descobri o olhar terno e maternal de Maria e, acima de tudo, fui tomando um contacto mais próximo e intenso com o Deus de Jesus.

Cedo coloquei a hipótese de fazer o juvenato, como experiência enriquecedora e educativa, como oportunidade de viver com outros jovens, conhecer outras pessoas, e, de facto, três anos depois do meu primeiro contacto com a MarCha, entrei de novo naquela casa, desta vez com as malas às costas e o coração nas mãos.

O tempo foi passando entre momentos de nostalgia, momentos de euforia, entre sucessos na escola e obstáculos no caminho, entre algumas atitudes exemplares e outras talvez menos recomendáveis, fui-me deixando envolver e penetrar pela presença de Deus na minha vida, por meio da vida fraterna, das actividades com os jovens, do exemplo dos Irmãos, da oração e de momentos de solidão e reflexão.

É certo que inicialmente não pensava sequer na idéia de continuar esse caminho. Planeava estar um ano em Vouzela e logo voltar à “vida normal”. Porém fui criando laços e assimilando aquela vida como sendo minha. Começaram a surgir as questões que me atormentavam frequentemente: “Que faço a agora? Continuo? Será que isto de ser Irmão Marista me pode servir? E tudo o que teria que abandonar?”

Durante os três anos que estive em Vouzela, tive períodos em que pensava seguir o caminho de discernimento e outros em que, por outro lado, nem sequer colocava essa hipótese. Vivi todo o tipo de experiências que viviam os jovens da minha idade, mantive relação com um bom grupo de amigos, com os quais também “armei” as minhas, cresci física, intelectual e psicologicamente e no final, fiquei com a sensação de que nada podia ter sido melhor.

Hoje, sou consciente de que sou um jovem perfeitamente normal, com um bom conjunto de capacidades bastante desenvolvidas e que apenas sou diferente dos restantes por ter tido a sorte de encontrar na minha vida um “caminho alternativo” e por ter tido a ousadia de enveredar por ele.

Os três anos que vivi em Vouzela, os meus três anos de Secundária, os meus três anos de juvenato, além de marcarem a minha vida, ajudaram a forjar a pessoa que sou hoje, as minhas convicções, as minhas amizades, a minha fé e por isso não sou capaz de resistir ao desejo de desafiar todos os que eventualmente possam ler este testemunho a terem a coragem de viver uma experiência como esta. Vale a pena arriscar um dia, uma semana, um ano, mas vale sobretudo a pena arriscar toda a vida, se o fazemos por “uma causa maior”, pelo amor, pela fé, pela fraternidade.

Atreves-te?